26 de jan. de 2009

Vânia Abreu e Marcelo Quintanilha. Download.




Não sei se vai funcionar, porque nunca tentei isso antes, mas bem, vivendo e aprendendo. Rs.


Se funcionar, o link abaixo será um guia pro download de um LINDO cd.


Lindo mesmo.


http://rapidshare.com/files/146410752/V_nia_Abreu_e_Marcelo_-_Quintanilha_Pierrot_e_Colombina.zip.html

“e nos corações, saudades e cinzas foi o que restou...”


Como saber se você gosta mesmo de alguém? Já me fiz essa pergunta, diversas vezes. Por diversas vezes, questionei até onde ia o amor que sinto, o que é exatamente o outro, o que são projeções minhas... o que é o amor que eu vejo e o que é o amor que o outro, por ser ele mesmo, me faz sentir. Hoje, mesmo que em pedaços, veio parte da resposta.


Hoje eu senti saudade.

Foi durante o show, olhei pro lado e desejei tanto te ver. Desejei ter você ali, sentado do meu lado. Desejei ver seu sorriso. Desejei apertar sua mão, olhar pra você na hora daquele refrão que eu gostei e que falava de amor, na hora daquele refrão que podia estar falando sobre nós dois...
Desejei você comigo, e ninguém mais.
Queria seu jeito desengonçado, o tamanho maior que a cadeira de qualquer teatro. A carinha compenetrada, de paisagem. Meu coração apertou tanto. Era pra ser com você.

“Mas é carnaval, não me diga mais quem é você... deixa o barco correr...”

E essa sensação, que tentava se fingir de nova, já sabia ser tão conhecida... foi a mesma daquele dia no cinema, quando vi a cena que queria comentar com você... quando desejei encostar no seu ombro, enrolar no seu braço.
Foi assim naquele pôr-do-sol. Num banho de mar, outro dia ainda.
Foi assim caminhando na praia.
Foi assim sentada, tossindo, no banco do parque, quando te mandei uma mensagem, enquanto pensava porque não tínhamos estado ali antes, e até parecia familiar, como se em algum momento estivéssemos ido.
Foi assim de manhã, quando acordei hoje.
É assim agora, e aqui.

Essa vontade louca de dividir meus dias, meus momentos com você. Essa vontade de te ver, segurar sua mão enquanto ando pelos lugares. Ser abraçada por você.

Não, não tem sido ruim estar sozinha. Não tem sido ruim me descobrir e descobrir o que eu gosto, reencontrar minhas amigas, dividir as tardes com vinho e piscina, conversas, risadas, livros. Nada disso tem sido ruim. Nem o pôr-do-sol, nem o banho de mar, nem o cinema, nem o romântico show. A felicidade me visita, sim, e tem passado com freqüência na medida em que acordo e me pergunto: então, Dona Felicidade, o que será preciso pra você vir me ver hoje?

Sinto meu coração acalmar com banhos de lua e de lavanda. Sinto a paz chegando entre as conversas sinceras e confissões verdadeiras a pessoas que se importam e realmente se preocupam comigo.

E sei que te amo, porque ainda agora, ainda com alegria em meus dias, ainda com ternura, queria você. Perto.

Música de fundo: Aquele frevo axé. Na voz de Vânia e Quintanilha.

"Veja onde a gente se achou
Estrelas já vão luzir
Na noite da baía preta
Queria tanto você aqui
Que fazer?..."

"Há tanto amor pra dar, que a gente nem sabe..."

E foi assim, bem naquele segundo, que deixou de sentir-se patética. Não, não sentia mais vergonha, pelo contrário. Sentia até certo orgulho, espécie de prestígio em sua atitude.
De ter corrido, chorado, descido degrau por degrau da escada. Sim! Era ela. Era seu desejo, sua vontade ali. Estava feliz por não tê-lo deixá-lo partir sem antes dizer. Sem tentar. Ficou feliz porque não engoliu tudo num gélido “ok”. Fico feliz por não ser mais uma dessas mudas, intoxicadas pelas dores e amores da vida. Por não ser mais uma das que ignora, das que disfarça, das que fingem. Mais uma das que não descem escadas.

Porque para entender da subida, meu bem, é preciso descer de quando em quando. Porque pra ser feliz, só às vezes, é preciso não desistir na primeira parada.

25 de jan. de 2009

"Tudo bem. Um beijo pra vc."



- Um momento, vou transferir para o suporte técnico.
- ...

23 minutos e 32 segundos depois.

- Suporte técnico, Alex, boa tarde.
- Boa tarde, Alex. Estou com um problema no meu aparelho. Não estou conseguindo enviar mensagens de texto. Este problema vem se repetindo, algumas vezes o serviço volta ao normal e depois para de funcionar novamente. (algo que me deixa insuportavelmente irritada, quando tenho vontade de arremessar longe o telefone, desmontá-lo com uma chave de fenda especial, chorar. Mas não digo isso. Me restrinjo ao óbvio e necessário para o andamento de um bom atendimento.) Será que o senhor poderia me ajudar?
- Vamos ver.(...) Agora dirija-se ao menu de mensagens. Clique em apagar todas as mensagens. Recebidas e Enviadas.
- Como?

E ele repete. Mais alto e com mais pausas. “Clique em apagar todas as mensagens. Recebidas e Enviadas.”
- Você quer que eu apague TODAS AS MENSAGENS QUE EU RECEBI OU ENVIEI? TODAS? TODINHAS?
- Sim.
- Não tem outro jeito de se resolver isso?????
- Senhora, esse é o procedimento
– retrucou o insensível. Cretino.
- Mas... é que.. tenho coisas importantes aqui...

Imbecil, ele deve ter pensado. Por que eu continuava falando?

Odiava esse homem. Odiava o suporte técnico. Odiava ter que me despedir assim de TODAS as MINHAS mensagens. Todas as nossas. Ai meu Deus... ai meu deus.

Engraçado disso tudo é que hoje mesmo me peguei pensando nesse assunto. Será que você já tinha apagado minhas mensagens? Será que você as relia, de quando em quando? Eu reli. Outro dia desses, assistindo o mar, peguei o celular e reli. Não foi tão bom, nem tão fácil, nem tão gostoso. Não apaguei nenhuma delas. E pensei que precisaria ainda de um bom tempo para fazê-lo.

Ai meu Deus.

Você não me parece do tipo que guarda mensagens antigas, em especial as de amor. Essa pequena pessoa otimista em mim quis me contrariar. Talvez sim. Mas não seria do tipo de relê-las, certamente. Isso não. Sem romances, sem chorumelas. Tudo muito prático, uma cisão perfeitamente realizada, com lâmina afiada, corte único, rápido, sem sangue, sem dor. Seco. Algo como: “Tudo bem. Um beijo pra vc!” ou algo parecido, já que a minha fonte inevitável de recordações digital e portátil foi deletada.

Sinto saudades de você quando era outro. Quando eu pensava em você como uma das pessoas mais sensíveis e doces que conheci. Mais apaixonantes. Sinto saudade de quando você acordou no meio da noite naquele dia, e que eu passei a noite rezando pra afastar todas as nuvens do seu lado. Foi a primeira vez que te vi com um certo medo, e por mais que me doesse te sentir assim, me coração não deixou de se alegrar enquanto me sentia útil, feliz de poder estar ali, do seu lado, de ter a chance de cuidar de você. Chamei alguém naquele dia e ouvi que nada de mal vai acontecer a vocês. Ninguém vai machucar. Nada de mal acontece. Diz a ele, não ter medo. Só carinho.


Achei engraçado isso. Ele disse carinho. Eu sentia carinho. Que coisa mais boa de sentir. Que saudade de sentir carinho!

Agora eu precisava apagar todas as mensagens a troco de responder a sua. Todos os eu te amos, (e suas quinhentas exclamações!!!!) todos os tô morrendo de saudade, todos os vem logo, amor; to indo logo, amor... tudo, tudo que sobrou pra mim do homem que eu amei, tudo que restou do carinho dele por mim. Ah. Era tão reconfortante tê-las ali. Era tão reconfortante poder abrir em alguma hora, mesmo que não fosse tão fácil, mesmo que não fosse tão gostoso, mesmo que, com o tempo, passasse a ser mais e mais raro. Mesmo que não fosse recíproco.

Agora seria o triste novo do “tudo bem, e vc?”. O triste novo, e seco.

Apaguei-as todas. Sem a chance de me despedir. Sem a chance de relê-las, uma a uma, saboreá-las mais uma vez.

Adeus, minhas mensagens. Sejam felizes nesse mundo das coisas que se foram. Infelizmente não posso mais visitá-las. Infelizmente não há entradas pra o novo mundo de vocês.

18 de jan. de 2009

"Paz (...) já me cansei de ser a última a saber de ti..."


- Foi, mas estive ocupado com... (...) não vi sua ligação (...) é que acabei marcando (...) precisei passar na (...) foi de última hora (...)mas bem, preciso ir (...) bom, se quiser vir agora, posso esperar...


Mentira.
Mentira.
Mentira.
Hum... velho e tão conhecido aroma, sabor, da mais sincera mentira.

Sempre achou que ele não mentiria. Nunca. Sua honestidade a encantou desde o primeiro segundo. Era ele. Transparente e lindo, como sempre sonhou. Ele seria duro e cruel, se necessário. Mas se em seus olhos, a amasse, ele a amaria. Inteiro. Verdadeiramente.

Ouviu tantas e tantas vezes que isso não podia ser verdade. Pessoas mentem! Homens, todos, mentem. Não se iluda, pequena...

Acreditava. Não, não com ele. Não ele! Era uma questão de princípios. Muito além do que os outros pudessem entender. Ele, jamais. E o que todos os outros tinham a ver com qualquer coisa?

A verdade é que confiava mais nele do que nela mesma. Ele era, ali, a ponte entre seus sonhos e o mais próximo possível de realizá-los. Ele era a coerência e a força que cativava em si e deseja encontrar mais a frente. Ele, sendo a sua própria e absoluta verdade, era a verdade mais acreditável. Mais amável. E sim, sem dúvidas, ela o amou. Ele. Seu gênio difícil. Fechado. Esquisito. Suas pressas. Suas demoras. Seu jeito desajeitado e estabanado, que a irritava, sempre. Seus conceitos e opiniões bem formuladas. Suas teorias. Seu olhar distante. Sua doçura. Seu beijo. Suas verdades.

Mas não mais.

Ponderou. Sim, ok, a culpa é única e exclusivamente minha. Eu acreditei, eu criei esse personagem, Mr. Very, very, good - que não mente, não desilude, não deixa esse gosto, seco, na garganta.

Era tudo muito simples. Tudo muito óbvio. Lógico. Ela continuava patética. Ele era mais um outro - mentiroso.

Ah, sim. Todo mundo mente.

E as mentiras, meu amor.... elas são essas luzinhas piscando no escuro. Uma criancinha perdida na praia, com bracinhos levantados e gritando, “eu, aqui, me encontra, me encontra, por favor...” E tudo que é preciso fazer, olhar pro lado. Nem se sabe como ela foi parar ali, mas no momento seguinte você sabe. Encontros casuais não tão casuais assim.

Não, meu amor. Não precisa mentir. Você nem é tão bom... E eu nem sou tão má, ao ponto de não te deixar em paz.

14 de jan. de 2009

"Preliminar com cafuné"



A noite passou rápido. Sentiu seus olhares cruzarem algumas vezes. Poucas vezes. Não estava pronta para olhares cruzados. Eles sequer se tocaram. Mas não estava pronta para ir embora.
Resolveram parar o carro, conversar. A verdade é que, naquele momento, ele era a única pessoa perto de quem ela desejava estar. Aquele era o único lugar no planeta onde ela gostaria de estar, e essa é uma das melhores sensações do universo... Assim, sem maiores explicações, tinha algo no seu jeito de tratar que acalmava seu coração, a deixava segura. Não demorou muito para que ele fosse a primeira pessoa em quem pensava antes de dormir, a primeira que lembrava ao acordar. O autor das mensagens que davam sabor ao seu dia. Que a fazia desejar ansiosa o dia seguinte. Assim, só pra saber o que viria pela frente.

Não tinha muitas certezas. Mas lembrava exatamente do segundo em que soube. Porque como tudo mais na vida, tem sempre aquele segundo em que você sabe.

Então, ele disse: - sei bem que não sou o que a maioria das mulheres considera um bom partido. Não tenho um carro importado, ainda moro com minha mãe. Tenho um filho. Não estou no auge da minha carreira. E seguia. “Não” isso, “não” aquilo... Ela ouvia atenta, meio séria, e achou engraçado sentir que seu coração sorria naquele momento. Sorria, meio até gargalhava, e tinha essa vontade gigante de abraçá-lo apertado. Tinha vontade de gritar todas as coisas lindas que poucas horas de seu lado a fizeram sentir. Seu coração era tudo que ela tinha de partido. Ele era a sua maior alegria. Naquele segundo, ela soube.

“Deixa pintar o entardecer, e o sol brincar de se esconder...”

- quero namorar com você.
- comigo?
- sim.
- tem certeza?
- sim.
(...)

Ela sempre adorou o fato de algumas pessoas realmente usarem a palavra “sim”.

Nesse momento, ele era a única pessoa assim que ela conhecia.

“Tarde e chuva, eu fico mais fogosa.”


Não foi difícil acostumar com seu coração sorrindo. Decidiu ignorar o tempo fechado e cair no mar assim mesmo. Precisava de um mergulho. Um mergulho bem fundo, de comemoração. Sentiu-se envolver - sim, o mar comemorava com ela, vibrando, intenso, enquanto ele observava, da areia. Viu as nuvens brancas no céu aproximarem, quase que a engolindo. Viu o céu e mar numa mesma linha, a mesma coisa, dentro e fora dela.

Ela sentiu Deus.

E nem foi difícil convencer, que foi só sorrir, ele entendeu, respirou fundo, mergulharam.
Depois pararam ali, abraçados, ouvindo o mar e o resto do mundo celebrar por eles. Não havia mais nada. Era a mais linda das músicas. Foi o dia mais mágicos de todos os dias mágicos que ela conhecia.

Ela sentiu amor.


Eles tiveram sol no dia seguinte.

Alô? Pra você. Ok.

- eu acho você brilhante. Você nunca acredita no que eu digo. Devia acreditar nisso.
- você também é brilhante, e não acredita.
- não, eu sou coro de rato.
- eu sei, além de brilhante, você é coro de rato...

É que no momento, preferia que não. Preferia que fosse só o mesmo, lindo, engraçado. Só o meu repete-a-mesma-frase-quarenta-e-cinco-mil-vezes. Onomatopéias. Bam. Aperta meu pé, aperta minha mão. Maaaais forte. Preferia só o sonho: “tô morrendo de saudade, que tal se a gente parar com isso agora e de uma vez por todas?”. Preferia um pouco menos “coro de rato”, um pouco mais como eu, lembrando. Irremediavelmente amando você.

13 de jan. de 2009

Trajetória.


Patético. E não conseguia esquecer. Como esse imenso quadro patético congelado em sua cabeça. Não, não um quadro. Como um imenso patético filme. Sim, porque seus personagens falam, movem, sentam, levantam. E lá vem o filme. 1, 2, 3. Ação. Outra vez. Sempre a mesma cena, passando repetidas vezes em sua infeliz e impecável memória: pede-implora-chora-pede-outra-vez-chora-mais-implora-centeeenas-de-vezes...
Tudo milimetricamente guardado na sua memória de elefante. Memória de elefante para uma pata. Patética. Tentou pausar, parar de vez a cena tortuosa, levantar da cama, concentrar-se em outra coisa qualquer. Correr dali. Mudar o canal. Tirar da tomada. Boicotar o sistema de energia do planeta. Nada.
Terminava a cena, paralisada na escada. Por que você veio aqui fora? Por que não continuou lá dentro?
Uma pata.

E agora, aqui fora, assistindo, deixou de ser Lisbela.
Não sentia.
Nem sentia raiva, vergonha, orgulho, mágoas.
Nem amor sentia. Sentir amor era doer mais do que ela poderia tolerar, na mesma cena, cem vezes, sem parar.
Era esse mega bem arrasado drama blockbuster e não sentia nada.
Teoricamente impossível para ela.
Praticamente tudo que sentia agora -
Impossível.
Vazio.

"Não há no mundo lei que possa condenar."


- então, você vem?
- onde?
- me ver.
- quando?
- hoje.
- não... hoje mais não.
- amanhã?
- amanhã se vê...
- a gente?
- talvez.
(...)

- tá tudo bem?
- não muito.
- posso ajudar?
- não. É comigo. Não me sinto bem.
- quer que eu vá ai?
- não. Quero ficar sozinho.
(...)

- você não retornou...
- estava ocupado.
- pode falar agora?
- diga.
(...)

- mas... o quê?
- nada demais.
(...)

- eu tô te atrapalhando?
- eu nunca disse isso.
(!!!!)

Socorro.
Perdi o caminho.

11 de jan. de 2009

Porque todos têm um lado "Pollyana" de ser.


Peço, desde exatamente agora, licença...

São muitas e muitas vírgulas, eu sei. Pode cansar, sei também. Como se diz? Desgastar.
OK.
Justifico apenas o texto (não este, mas o abaixo), dizendo que, entre tantas e indesejadas interrupções, fiz a opção, otimista que sou, pela chance de ser:
vírgula

(relatos de um ser que desenvolveu certa antipatia matinal pelos pontos finais,

10 de jan. de 2009

E outra versão do começo.

Começou ali.

Pensou. Ou ele disse?
Não importa. O fato é que começou ali, naquele sofá. Ela entregou o livro para que ele passasse o tempo, esquecendo dos ares quase-que-bem-que pornográficos de um ou outro conto.

Ele gostou. A cena nunca mais repetiu, como tinham tantas vezes imaginado, mas naquele dia, aquela cena, ele lia, sorrindo.


Começou ali, portanto, o livro e seu autor como uma espécie de padrinho de um beijo que poderia, de um amor que poderia, de tudo que foi e agora acabou.

Achou engraçado, quando, fuçando as coisas durante a sua própria fossa, achou trechos dele, espalhados, contando sua dor. Era como se o autor estivesse ali, agora, no sofá do seu lado, revoltado pelo fim do relacionamento que tinha tido o gosto de abençoar.

Em sua homenagem, portanto, ou usando disso como desculpa para valer-se das palavras do autor, para extravasar seu instante, copiou, incansável, as palavras que lhe dizia.

Overdose daquele que seria, para sempre, seu melhor padrinho.

Caio Fernando Abreu - I


"Você vai me abandonar e eu nada posso fazer para impedir. Você é meu único laço, cordão umbilical, ponte entre o aqui de dentro e o lá de fora. Te vejo perdendo-se todos os dias entre essas coisas vivas onde não estou. Tenho medo de, dia após dia, cada vez mais não estar no que você vê. E tanto tempo terá passado, depois, que tudo se tornará cotidiano e a minha ausência não terá nenhuma importância. Serei apenas memória, alívio, enquanto agora sou uma planta carnívora exigindo a cada dia uma gota de sangue para manter-se viva. Você rasga devagar o seu pulso com as unhas para que eu possa beber. Mas um dia será demasiado esforço, excessiva dor, e você esquecerá como se esquece um compromisso sem muita importância. Uma fruta mordida apodrecendo em silêncio no quarto."

Caio Fernando de Abreu - II

“E tudo que eu andava fazendo e sendo eu não queria que ele visse nem soubesse, mas depois de pensar isso me deu um desgosto porque fui percebendo, por dentro da chuva, que talvez eu não quisesse que ele soubesse que eu era eu, e eu era.”

"Eu quis tanto ser a tua paz, quis tanto que você fosse o meu encontro. Quis tanto dar, tanto receber. Quis precisar, sem exigências. E sem solicitações, aceitar o que me era dado. Sem ir além, compreende? Não queria pedir mais do que você tinha, assim como eu não daria mais do que dispunha, por limitação humana. Mas o que tinha, era seu. "

"Mas não se preocupe, não vou tomar nenhuma medida drástica, a não ser continuar, tem coisa mais autodestrutiva do que insistir sem fé nenhuma? Ah, passa devagar a tua mão na minha cabeça, toca meu coração com teus dedos frios, eu tive tanto amor um dia, ela pára e pede, preciso tanto tanto tanto, cara, eles não me permitiram ser a coisa boa que eu era.”

"Sim, tenho vontade de me jogar pela janela, mas nunca foi possível abri-la. Não, não sei o que gostaria que você me dissesse. Dorme, quem sabe, ou está tudo bem, ou mesmo esquece, esquece.”

"Chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, pelo que perdi de mim, pelo ontem morto, pelo hoje sujo, pelo amanhã que não existe, pelo muito que amei e não me amaram, pelo que tentei ser correto e não foram comigo. Meu coração sangra com uma dor que não consigo comunicar a ninguém, recuso todos os toques e ignoro todas tentativas de aproximação. Tenho vergonha de gritar que esta dor é só minha, de pedir que me deixem em paz e só com ela, como um cão com seu osso.A única magia que existe é estarmos vivos e não entendermos nada disso. A única magia que existe é a nossa incompreensão."

“Fico tão cansada às vezes, e digo pra mim mesma que está errado, que não é assim, que não é este o tempo, que não é este o lugar, que não é esta a vida. E fumo, e fico horas sem pensar absolutamente nada: (...) Claro, é preciso julgar a si próprio com o máximo de rigidez, mas não sei se você concorda, as coisas por natureza já são tão duras para mim que não me acho no direito de endurecê-las ainda mais."

Caio Fernando Abreu - III

"Olha, antes do ônibus partir eu tenho uma porção de coisas pra te dizer, dessas coisas assim que não se dizem costumeiramente, sabe, dessas coisas tão difíceis de serem ditas que geralmente ficam caladas, porque nunca se sabe nem como serão ditas nem como serão ouvidas.
(...) Deixa eu te dizer antes que o ônibus parta que você cresceu em mim de um jeito completamente insuspeitado, assim como se você fosse apenas uma semente e eu plantasse você esperando ver nascer uma plantinha qualquer, pequena, rala, uma avenca, talvez samambaia, no máximo uma roseira, é, não estou sendo agressivo não, esperava de você apenas coisas assim, avenca, samambaia, roseira, mas nunca, em nenhum momento essa coisa enorme que me obrigou a abrir todas as janelas, e depois as portas, e pouco a pouco derrubar todas as paredes e arrancar o telhado para que você crescesse livremente.
(...) Sabe, eu me perguntava até que ponto você era aquilo que eu via em você ou apenas aquilo que eu queria ver em você, eu queria saber até que ponto você não era apenas uma projeção daquilo que eu sentia, e se era assim, até quando eu conseguiria ver em você todas essas coisas que me fascinavam e que no fundo, sempre no fundo, talvez nem fossem suas, mas minhas, e pensava que amar era só conseguir ver, e desamar era não mais conseguir ver, entende?"

"(...) eu reconheço que muitas vezes falei por metáforas, e que é chatíssimo falar por metáforas, pelo menos para quem ouve, e depois, você sabe, eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem, está bem, eu espero aqui do lado da janela, (...)"
"(...) esse velho não vai mais incomodar você, olha, eu ainda não disse tudo, e a culpa é única e exclusivamente sua, por que você fica sempre me interrompendo e me fazendo suspeitar que você não passa mesmo duma simples avenca?(...)"

Caio Fernando Abreu - IV

"Algumas vezes eu fiz muito mal para pessoas que me amaram. Não é paranóia não. É verdade. Sou tão talvez neuroticamente individualista que, quando acontece de alguém parecer aos meus olhos uma ameaça a essa individualidade, fico imediatamente cheio de espinhos - e corto relacionamentos com a maior frieza, às vezes firo, sou agressivo e tal. É preciso acabar com esse medo de ser tocado lá no fundo. Ou é preciso que alguém me toque profundamente para acabar com isso."

"E uma compulsão horrível de quebrar imediatamente qualquer relação bonita que mal comece a acontecer. Destruir antes que cresça. Com requintes, com sofreguidão, com textos que me vêm prontos e faces que se sobrepõem às outras. Para que não me firam, minto. E tomo a providência cuidadosa de eu mesmo me ferir, sem prestar atenção se estou ferindo o outro também. Não queria fazer mal a você. Não queria que você chorasse. Não queria cobrar absolutamente nada. Por que o Zen de repente escapa e se transforma em Sem? Sem que se consiga controlar".

Caio Fernando Abreu - V

"Talvez um voltasse, talvez o outro fosse. Talvez um viajasse, talvez outro fugisse. Talvez trocassem cartas, telefonemas noturnos, dominicais, cristais e contas por sedex (...) talvez ficassem curados, ao mesmo tempo ou não. Talvez algum partisse, outro ficasse. Talvez um perdesse peso, o outro ficasse cego. Talvez não se vissem nunca mais, com olhos daqui pelo menos, talvez enlouquecessem de amor e mudassem um para a cidade do outro, ou viajassem junto para Paris (...) talvez um se matasse, o outro negativas. Seqüestrados por um OVNI, mortos por bala perdida, quem sabe. Talvez tudo, talvez nada."

"Mas sempre me pergunto por que, raios, a gente tem que partir. Voltar, depois, quase impossível" (C.F.)


Sempre dói, mas sempre passa.

E ela sabia. Sabia e lembrava todas as vezes que doeu, sem que isso significasse absolutamente nada agora. Da última vez foi pior. Foi? Não sabia. De certa forma, lembrava o estrago (noites mal dormidas, seguidas de dias cansados, horas lentas demais, ora longas demais, nada de fome, vontade de comer o mundo. Lágrimas. Muitas lágrimas...), mas não conseguia comparar nada com o aperto que sentia agora. Hoje, seria a pior dor de sempre. Viu como passa? Não lembra a dor do estrago...

Pensar nisso, porém, (e repita-se), não estava ajudando nada. Deveria, tudo bem, - mas não estava.

E daí se estava perdida, e daí se queria tentar uma nova profissão a cada segundo, e daí se nos minutos seguintes continuava na mesma profissão, imaginando como seria se tivesse mudado no segundo anterior? As respostas não estavam nele, isso decerto. Aliás, estas respostas aparentemente não estavam em lugar algum. Exatamente como ela, vagando nesse vácuo intertemporal que inventou para passar a chuva. Você está mesmo aqui, querida? Porque me parece estar longe... em algum outro lugar. Mais uma vez: exatamente.

Perguntou-se, por fim. Se as respostas não estão em lugar algum, e eu estou em lugar algum, elas deveria estar bem por aqui........................ hum?

­Nada como mais um dia sem hipocrisias.