30 de mai. de 2009

"Será que meu plano é bom, será que é no tom, será que ele se conclui?"



Que doce foi provar meu próprio veneno...

Há coisas nessa vida que não se imagina até o dia que se sente. Não sabia o efeito de palavras. Eu, que as amo, que paraliso em seus mistérios e me deleito com suas peculiaridades, me sinto agora tão pequena, garota a cativar estátuas de Deuses. Não que os subestime, pois os respeita, mas foge-lhe aos olhos a verdade: seu poder.
Palavras que se reúnem poderosas, me reviram de dentro pra fora e roubam de mim tudo que mais acreditava ter: palavras.

Tantas vezes tentei em vão lê-las em seus lábios, encontrá-las soltas nos olhos, presas no sorriso, em um gesto qualquer... pedi, hesitei, deixei meus pensamentos passeando por lugares insossos, circulares, para em seguida repreendê-los como um boa mãe à menina levada.

Era outra vez ingênua em pensar que, poderosas como são, elas e seu criador não teriam tempo próprio. Tão impossível pressioná-las antes, quanto impossível fugir e evitá-las agora.

Sim, já vi efeitos de palavras, já ouvi tentativas tão vãs quanto a minha agora para explicar o que quer que seja que se sente... Não há palavra que agüente tanto baticum. Não há coração que chegue, não há cabeça que não gire, não corpo que não sinta, leve, enrubescer, bochechas quentes e vermelhas - pra colorir o pouco bege do meu rosto.

Fechei os olhos em cada pausa, li com demora cada frase. E se fosse um teatro, aquele era meu texto. Decoraria suas linhas, estudando as possíveis entonações e os gestos que poderiam se encaixar. Devoraria palavras, faminta, e, no entanto, mais completa do que soubesse imaginar.

Mas não era teatro. E qualquer coisa que dissesse a respeito seria grande demais, ou pequena demais, ou, sem sombra de dúvidas, clichê. Ainda é bom ouvir clichê? Porque tenho agora um repertório, rondando e sugando todas as minhas palavras, frases seguidas de exclamações, reticências, pontos, frases que colariam bem em qualquer cartaz, e as quais recitaria vorazmente pra você agora, se isso não me deixei ainda mais ruborizada – embaraçada em minhas próprias palavras.

Esta noite, minhas palavras são comuns. Coloridamente comuns.



*Foto retirada de:vidacheiadecoisas.wordpress.com/.../02/palavras

27 de mai. de 2009

Slowly.

Ela bebia lentamente, goles lentos, vagarosamente saboreados. Não fazia mais idéia do horário, sentia o princípio agradável da embriaguez acontecendo, tinha os lábios dormentes e o corpo relaxado. Até esboçava um sorriso e ao dar-se conta disso riu alto, gargalhou sozinha com os olhos centrados apenas no copo. Apreciava o tom interessante de sua bebida.

Ele aproximou-se e perguntou seu nome. Ela balbuciou qualquer coisa, ele já estava sentando ao seu lado, ela não queria companhia, mas sentia-se cansada demais para discutir, ele pediu mais duas doses, “e esta será a última” – ela pensou.

Ele falava demais, mas não a incomodava. Um tom de voz deliciosamente másculo, palavras que saiam doces no meio de um expandido sorriso. Ele tocou seus cabelos, e seus dedos passeavam sem propósito, deslizavam em espiral pelas pontas, enrolando-as entre os dedos, tocando-lhe acidentalmente o pescoço - o que a fazia arrepiar, e era, por vezes, difícil disfarçar. Não sabia como ele tinha chegado até seus cabelos. Mas não reagia.

Sentia sede pelo toque dele, sentia sede pelos dedos entrelaçados em seu cabelo, pela boca que falava sem parar. Ela queria que parasse, em um beijo em seu pescoço tão lento e longo quanto seus goles aquela noite. Fechou os olhos por um segundo e foi como se ele lesse sua mente, pois em seguida passava as mãos em sua nuca e a segurava, carinhoso e firme. Apoiou a outra mão em sua coxa, pernas dela cruzadas, ele não parecia ligar, nada era incomum ou desconcertante, era ainda o segundo drink, ele agia como se a conhecesse há anos, tocando-lhe com naturalidade e despretensiosamente.

Ela já respirava seu hálito, doce e seco como a bebida que escolheram. Ele passou os dedos em seus lábios, até que ela os entreabriu, respirando pouco mais fundo.

Foi quando ele a beijou pela primeira e última vez. Beijo quente e demorado, ele a sentiu entregar-se em êxtase e imaginou como a noite seguiria bem... Sentia desejo em cada canto daquele beijo, ela não era uma mulher qualquer.

Ela o beijou como se nada mais houvesse. Nem bar, garçons, nem noite, nem tempos. Beijou inteira, intensa e suave. Eles eram lentamente quentes, o que povoava os pensamentos dele com as mais “insólitas idéias”.

Ela descolou sua boca e pela primeira vez na noite, sorriu para ele. Olhou-o com o canto dos olhos, dos pés a cabeça. Era sua forma de agradecer. Puxou a bolsa, levantou-se. Levou os lábios e uma das mãos ao rosto dele, num suave beijo de despedida. Beijou sua face, do lado esquerdo.

Ele segurou sem braço, em protesto. O que ela estava fazendo? Aonde ia?

Ela não disse nada, apenas soltou-se com graciosidade, devolvendo a mão dele até a mesa. Deixou algum dinheiro para garantir sua parte da conta. E se foi.

Essa era ela.
E aquilo era tudo que desejava oferecer.

16 de mai. de 2009

Em que pese...


E nesse dia tiveram seu primeiro “não gosto”.

- Não gosto disso em você.

- E eu, tão pouco.

O primeiro não gosto é sempre estranho. Um atabaque vibrando no meio da orquestra. Um violino desafinando no meio do forró. Erva daninha num jarrinho de flores.

Não gostava de um monte de coisas, só que nenhuma das componentes de sua vasta lista tinha aparecido nele. Isso, até então. Estréia do primeiro item desagradante. E vice-versa? Não podia deixar de pensar que sim. Já que é deste lugar, de quando não gostamos de algo, do nosso descontento e da raiva, que transparece também a nossa sombra. Ela fica ali, exposta – reação que se torna ação, fenda aberta na máscara do novo.

Ambos viram razões pra não gostar, então.

O “não gosto” abusou um pouco seus ouvidos, dormiu do seu lado no travesseiro. “Não gosto”, esse monstrinho verde cintilante, iluminando o quarto bem além do agradável pra o sono ficar. Muriçoca chata e bzzz persistente. Precisava de uma raquete, e depressa.

Pensou em jogar “não gosto” pela janela. Pensou em mandá-lo de volta ao lugar de onde veio, em dar a própria sombra pouco mais de espaço e ignorar o mau-humor alheio que a presença dela costuma causar.

Mas falaram antes que pudesse se decidir. Congelou o tom de voz, tentando ganhar tempo, mais tinha esse defeito de fabricação: era óbvia demais.

- Tá tudo bem? Pensei que tivesse ficado chateada.... – perguntou ele, cutucando, ingênuo, a caixa de pandora - e facilitando as coisas pra ela.

- Fiquei.

- Ficou? Por causa de ontem? (perplexo)

- Foi.

- ..... (perplexo e semi-arrependido? Perplexo e reflexivo?).

- Imaginei. – concluiu ele, atestando o que ela já imaginava sobre seu tom, exatamente: óbvio.

Riu de si mesma enquanto deu vazão ao seu gênio irritadinha. Riu da situação. E riu dele. Perplexo.

E como tudo que a agrada, terminaria em piada.

- Então, se possível, não repete isso e blá, blá, blá... – imperativa. (de irritada, as vezes passava pra imperativa, era um outro mal).

- Ok, não foi o que quis dizer – sincero.

(Todavia, ressalte-se, nem tão obediente assim).

Daí ele vai, e volta com uma lembrança - ode elaborada ao “não gosto” que ela passou uma tarde fuzilando. Ele riu de si mesmo, dela, da situação. Era o cúmulo da cafajestagem. O cúmulo da audácia humana. E o cúmulo do engraçado. Adorou.

E, mais uma vez, sua balança pendeu pro lado dele.



11 de mai. de 2009

Contreras.

Caiu na mesma armadilha mais uma vez. E tinha medo do eco de suas palavras, doces ou amargas, novas ou antigas. Já não se sentia segurar em falar ou escrever nada, suas mensagens, soltas no espaço, eram entendidas por sua densidade e não vácuo que deixavam. Preocupava-se, mas não suficiente para parar de digitar.

Ela quer que o telefone toque, ela quer esquecer que o telefone existe, ela quer ter paz de tantos toques diferentes e desimportantes, ela quer se sentir importante pra alguém e ou que isso também deixe de ser importante. E logo.

Ela detesta ser a menina que chora. Ela quer ser leve e alegre. Ela não quer levar suas lágrimas pra ninguém, mas ela está carente de alguém para secar-lhe as lágrimas.

Ela cansa de sorrir demais, mas ela sorri quando lembra de você. E agora ela chora, achando que você não entenderia nunca. Que você a detestaria por isso. Que você vai achá-la fraca e emocionalmente desestruturada.

Desestruturada. Ela se sente assim também. E ela escreve enquanto espera ansiosa pelo toque do telefone. Ela está ansiosa o tempo inteiro. Ansiosa, ansiosa, ansiosa. Nada parece estar adiantando. Ela liga o som e não parece estar adiantando...