2 de nov. de 2011

Uma vírgula, e ponto de seguimento...





Sim, sim, sim! - gritava para si mesma. 
- Sou uma mente confusa...

Por vezes desejava sentir uma certa solidariedade emocional, a compaixão dos que sofrem ou se lambuzam de amores tórridos, dos que temem, dos que nunca temem, dos que se entregam, dos que se esfregam...

De outras, desejava ser apenas. Apenas, assim, unicamente, exclusivamente, ela. Desejava escapar do medonho roteiro de ser mais uma, personagem esquecível em um mundo cheinho de esquecimentos...

E lembranças? O que faria então com sua memória elefante? Esqueceria realmente todo o esquecível, classificaria “esquecibilidades”, escolhendo o que ou não guardar em uma caixa antiga de recordações?

Devia ater-se a caixas e caixas de lembranças lindas, ou soltá-las em bolas de sabão, balões de gás,  daqueles que nunca, nunca se sabe onde irão chegar...?

Era a primeira vez que ele falava daquele jeito. Ou, talvez, não fosse esta a primeira vez, mas certamente sentia-se como se fosse.

Ele, no seu mundo trancado a cadeados, carregando nos olhos o mistério dos que pouco falam, dos que escondem pensamentos em abismos mais fundos do que os acessíveis ao mais X dos X-men, mas, contudo (ela sabia...) sentindo – e carregando sentimentos mais “tagarelas” do ela própria poderia falar, porque ele sentia tanto, porque aqueles olhos despejavam mares, rios inteiros, e pôr-do-sol, e noites de lua, e cânticos, e poesia...  

Era a primeira vez que ele falava daquele jeito. Ou, talvez, não fosse esta a primeira vez, mas certamente sentia-se como se fosse.

6 de set. de 2011

Como se não bastasse.


Parecia mesmo que não bastavam um ao outro.

Enquanto percorria, confuso, os retratos e maus tratos pelo computador, enquanto relia e-mails trocados sabe-se lá quando, ou quanto, ou com quem...
Matava-o a duvida. Dividi-la seria repartir parte de si mesmo, mas se escolher, sem desejar, sem opinar. Não. Não a veria outra vez, para outra vez repassar todas as noites, os retratos, os maus tratos registrados em seu computador.

Maldizia o mundo tecnológico. Preferia as cartas, assinadas ou apócrifas, mas de próprio punho, dignas de precisas investigações caligráficas e combatidas em duelos decisivos travados no final da tarde cinza de uma sexta-feira.

A espera do fim de semana não o ajudava em nada. Verificar registros em busca de conversas apagadas, ou passadas, ou que nem sequer existiram, mas desde então ressonavam em seus pensamentos, como os mais doces cânticos de amor – ou de morte.

Reservava-se, no entanto, o direito de não pertencê-la. Nos braços de outras, anestesiava sem culpas seus pensamentos mais sórdidos e descontava, ah, descontava, cada uma das traições não traídas, ou traídas, extraídas, naqueles poucos momentos de gozo e de prazer.

Parecia mesmo que não bastavam um ao outro.

E ainda assim ela era tudo que ele queria, tudo que não o sossegava, que o cegava, que não o deixa dormir após prazeres, lazeres, afazeres inventados para preencher seus medos-vazios.

Na janela ao lado, ela dormia.

Sonhava com longas noites de amor e brigas ferrenhas e violentas, revezando seus sonhos entre dores e alegrias, igualmente plenas. Ela dormia, sem escutar angustias ou gemidos advindos do quarto ao lado.

Ela dormia a felicidade dos que ignoram e, ainda assim, sonham.

10 de mai. de 2011

Porque Vinicius disse pra mim... (em sussurros)




AMOR


Vamos brincar, amor? vamos jogar peteca
Vamos atrapalhar os outros, amor, vamos sair correndo
Vamos subir no elevador, vamos sofrer calmamente e sem precipitação?
Vamos sofrer, amor? males da alma, perigos
Dores de má fama íntimas como as chagas de Cristo
Vamos, amor? vamos tomar porre de absinto
Vamos tomar porre de coisa bem esquisita, vamos
Fingir que hoje é domingo, vamos ver
O afogado na praia, vamos correr atrás do batalhão?
Vamos, amor, tomar thé na Cavé com madame de Sevignée
Vamos roubar laranja, falar nome, vamos inventar
Vamos criar beijo novo, carinho novo, vamos visitar N. S. do Parto?
Vamos, amor? vamos nos persuadir imensamente dos acontecimentos
Vamos fazer neném dormir, botar ele no urinol
Vamos, amor?
Porque excessivamente grave é a Vida.

Vinicius de Moraes


*foto extraída do site: http://diamantesdeacucar.blogspot.com/2010/06/ser-feliz.html

Porque não?



Porque pra mim o tempo não passa,
Porque me inspiro como respiro
Porque saudade se tem até de perto
Mas você não me parece tão distante

Porque desejo acordar nos seus braços
Porque conheço detalhes de seu riso
Porque um sonho pode ser só mais um
Mas sinto você, bem real

Porque nossas realidades se encontraram
Porque foi no mais exato e especial lugar
Porque não sei se foi só mais um golpe da magia
Mas é por você, e só você, que me encanto.

7 de mai. de 2011

O mundo aos meus pés...



Eram pés cheios de calinhos. Não que desgostasse, pois não se reclama de pés tamanho 34, ensejadores oficiais de elogios fofos dentro e fora dos sapatos.

Seus calinhos eram o que eram: marcas secas de longas caminhadas, discretas rachaduras, do tempo, das pegadas firmes, das mal pisadas, cicatrizes próprias de suas escolhas.

Ainda assim, resolveu livrar-se deles. Verdadeiras damas têm pés finos, macios, agradáveis, pele suave e hidratada em todos os pedaços.

Ora, os seus calinhos destoavam dos standart atual de delicadeza feminina. Era preciso enquadrar-se, curvar-se aos moldes adocicados de beleza, assim como seus não tão finos pés.

Marcou consulta. Um especialista. Analisou calo a calo, linha a linha, impressionado. Parecia mesmo assustado. Meus pés, me olhavam ainda mais assustados. Era um de dia difícil para eles.

Acalmei-os. O especialista ajudou: massagens e cremes perfumados, refrescantes... até a lixa foi gentil com eles.

Sai feliz e satisfeita. Tinha pés como os das mais belas, pés de artistas de cinema! Uau!

Uau! Uau, au, auuu, ai, ai, aiiii, poxa vida!

Como dói.

Foi isso. Meus sapatos me detestam. Todos, todinhos, só restaram umas velhas havainas, porque elas não odeiam ninguém, coitadas.

Era como se tivesse desaprendido a andar, de tão desajeitada que fiquei. Ai! Outro pedacinho que se contorcia, as voltas com as tiras de minhas sandálias vermelhas: lindas e cruéis.

Meus pés retrucaram. A cruel era eu. Lapidadora injusta de calinhos de proteção!

Quem mandou tentar andar com pés dos outros?

"Você me ama exatamente como eu gostaria..."


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Sorriu, como para um espelho.

Não sabia exatamente como seria ser amada.
Era apenas o silêncio de sua alma e a vontade de nunca, nunca parar – voltas musicadas de um carrossel sem curso, sem hastes, sem freios...

Desejava ligar e contar tudo. Palavra por palavra, proferir, ato obsceno e escandaloso que era a verdade que cercava, sem medo, sem preparativos, simples, direta.
- É você.
Não se sabe o fim da estória. Todos os prováveis e improváveis caminhos que os direcionariam dali, daquele inusitado encontro, das destemidas palavras, das palavras de agora, que mudariam tudo. Ou apenas direcionariam seus pés ao caminho que já era deles.
Não saberia.
E deslumbrada por não saber, sentava-se em frente ao computador, deixando que os dedos ditassem as palavras que lábio algum comportava... Ao menos não sem transformá-las em beijo, em desejo, em amor.
Não sabia exatamente como seria ser amada, exceto por si mesma: pois para amá-lo tanto, inevitável sorrir (como para um espelho), mesmo no mais chuvoso dos dias, a felicidade do amor.

7 de abr. de 2011

"- E você nem sabia que podia gostar assim"


Não me culpe
pelos beijos que já não irá receber.
Nem pelos dias, pelas estórias,
Não me culpe pela falta de ar
ou de vida em sua vida.

Não escolhi te deixar,
Segui em frente: a mesma trilha
Mesmos passos, mesma intenção
Mesma cor de olhos que tive quando te vi.

Cada brilho nosso se perdeu
Entre pedras e moinhos,
Entre ondas, furacões,
Ficamos sós em longas noites,
Por curtos dias, pelo pouco espaço,
Na imensidão.

Não, me culpe.

Não fui eu, mas o amor -
que me levou.