27 de jan. de 2014

Cuidadosamente.


Era um tempo cheio de cuidados.

Tempo de cuidados doces. Leves. Despreocupados. Sem aflição, sem desespero, sem correria.

Cuidado com o jardim, a paisagem, as borboletas.
Cuidado de passar protetor solar pela manhã e escovar os dentes todas as noites.
Cuidado de deixar espaço livre, cuidado de não fazer tantos planos. Cuidado de escutar, cuidado de fazer pausas.
Cuidado de comer bem, cuidado de exercitar. Cuidado de levantar cedo, de trabalhar, de ter disposição. Cuidado de respirar fundo e espreguiçar. Cuidado de perceber o que se passa no coração.
Cuidado de relaxar depois do expediente. Cuidado de ir à praia e pisar na areia.
Cuidado de abraçar os amigos e ficar por perto, cuidado de ligar no meio do dia e saber da família. Cuidado de ouvir a notícia importante, cuidado de ler aquele livro.  
Cuidado com a saudade, cuidado de lembrar (com demora...) aquele beijo.
Cuidado com os sonhos, com pedir sempre proteção antes de dormir. Cuidado e vontade de responder e estar perto.

Eles se cuidariam, distantes.

Para que então (quem sabe, então?), assim, devagarinho, carinhosamente, cuidassem um pouco um do outro.




"O maior presente que você pode dar a alguém é o seu próprio desenvolvimento (...). Eu costumava dizer: ‘Se você cuidar de mim, eu cuido de você’. Agora eu digo: ‘Eu cuidarei de mim para você, se você cuidar de si mesmo para mim’.”- Jim Rohn.




crédito da foto: http://umavidaverde.com/


23 de jan. de 2014

Quero assim... rs



Não quero que você
Seja mais um fiel (ou cruel...)
Que construa castelos de vento
Nem diga que me ama
Um tanto assim
Quero de você
O que quero pra mim

Que permita um tanto,
Aceite outro pouco,
Quero que deite do meu lado (inteiro, calado)
 E não se assuste
Se a paixão chegar
Tomar, sugar, arrepiar.

E se a paixão vier, deixar
Desconstruir todas as verdades
Desnortear todas as bússolas
Desacertar todos os relógios

Quero que não brigue
Se eu for bem perto
E beijar por dentro
Seu coração

Quero que perceba
se os relógios congelarem
em nosso beijo
e não assuste
se acelerar um pouco mais o coração

E na boca
Umedecer seus lábios
Com um veneno original
(bem meu, receita própria)
Para morte lenta, suave
E inesquecivelmente feliz.


- Porque, às vezes, (e só às vezes) também se morre de alegria. 

9 de jan. de 2014

Porque Sim.


Nem ia falar em saudade.

Não que não sentisse. Desde a hora que ele saiu pela porta, era saudade. Quando arrumou a cama de manhã, quando recolheu as taças, quando trocava de roupa: saudade.

Entendeu que a saudade não era pela distância ou pelo tempo. Era saudade trazida pela ausência do recente, do novo... dele. Curioso, porque disseram que pra sentir saudade é preciso de tempo, mas o tempo mal havia passado, e era saudade, presente.

Ainda assim, escolheu que não, nada de falar em saudade. Preferiu guardar a palavra, como quem finge não a conhecer, esconder dos lábios e dos teclados, fixar apenas nessas outras tantas sensações que a percorriam sem qualquer licença.

Das palavras dele, uma frase: “você tá bem?” Ele perguntava como quem queria ver atrás de cada pensamento. Como aquela amiga que escreveu pela manhã: “manda notícias sinceras de você”.

E como estava, sinceramente?

Sentiu certo receio de contar sobre tudo mais o que sentia, sobre cada pedacinho... Receio de assustar, já que estava, ela própria, assustada – ao notar que responder “bem” era pouco (tão pouco!), ver que sentia essa paz, e a alegria...

Sim, tudo vem no seu tempo; sim, a saudade estava e estaria à espreita; sim, não queria pressa, atropelos, ansiedade. Mas, sim, esse era um dia daqueles em que tudo de bom se sente um pouco mais, e decidiu aproveitar. Deliciar-se no êxtase que vinha de cada notícia dele, do coração acelerado, do gosto do beijo em sua boca.

Se devemos permitir quinze minutos por dia para a tristeza, ela deixaria vários outros intervalos para a paixão.

E porque não?

Afinal, ela estava bem.   


Crédito da foto: http://www.mensagenscomamor.com/frases_de_saudades.htm

"Ah, se já perdemos a noção da hora..."



E no intervalo, o amigo se queixava:
- Gosto dela. O problema é essa presa... É como se ela me dissesse: “tá... pronto! Vai ser com você: e VAMO LOGO.” Sabe como é?

Sim, ela sabia. Pressa era um sentimento bastante familiar. Pensou em como essa tal e específica pressa feminina assusta os homens, enquanto a maioria das mulheres passa tanto tempo procurando ouvir justamente o“vamo logo” de alguém que elas verdadeiramente se interessem. Nos sonhos dourados femininos, esse alguém de quem se gosta vem com toda a pressa, diz que ama, que não consegue ficar longe... não?
Ah, sim, os tempos estão mudando... Mas olhava em volta e ainda via balões cor-de-rosa, inflados com pensamentos e ideais do amor romântico.
Pensou na sua própria pressa. Pelo que tinha pressa, na verdade?
Sua pressa mudava o foco e já nem estava mais no mesmo lugar desde a última vez que a procurou. Pensou na alegria de estar exatamente onde estava e em todos os percalços que a trouxeram, pensou que sua pressa era medo, que seu medo era controle – ou a falta dele –, pensou que a solidão, a pressa, o medo, o controle, e tudo mais que tentava não ver só a perseguia (e com mais pressa!), cada vez que tentava fugir.

Lembrou do amor grand hotel, da paixão atropelada pelo caminhão e transformada em ‘bom dia’. Da paixão que ela achou que viveria para sempre. Lembrou que Iaiá era apenas um retrato tirado por alguém que pecou na vontade e se atirou, depois de óbvios utópicos beijos e de constatar que “prever serviu pra eu me enganar”. Iaiá, tão invisível quanto a mulher do filme, projetada milimetricamente, como uma capa de chuva - mas para proteger do amor e suas dores, formatada para poupar seu criador de toda a angústia da pressa (ou da falta dela), de todas as tolices que pertencem ao mundo dos que se apaixonam.

Ela ainda era 'de paixões' e não pretendia mudar. Se seus passos tornaram-se mais lentos, porém, ao longo do caminho, e se a paisagem lhe trazia novos ângulos e sons, sentia-se disposta a seguir.

De longe, ouvia: "- Não se engane, sangue quente corre em suas veias, e a própria natureza não cabe mudar".
Mas há no peito um coração de muitas canções e muitos ritmos – e no olhar a disposição para enxergar um pouco além e, quem sabe, dançar novas músicas.... (talvez, até, um pouco mais lentas).


Referências, citações e créditos: 
Foto: http://super.abril.com.br/blogs/como-pessoas-funcionam/por-que-as-vezes-tempo-voa-e-outras-vezes-se-arrasta/ 
Grand Hotel (George Isarael e Paula Toller)
Retrato pra Iaiá (Rodrigo Amarante)
A mulher invisível (Cláudio Torres)