7 de mai. de 2011

O mundo aos meus pés...



Eram pés cheios de calinhos. Não que desgostasse, pois não se reclama de pés tamanho 34, ensejadores oficiais de elogios fofos dentro e fora dos sapatos.

Seus calinhos eram o que eram: marcas secas de longas caminhadas, discretas rachaduras, do tempo, das pegadas firmes, das mal pisadas, cicatrizes próprias de suas escolhas.

Ainda assim, resolveu livrar-se deles. Verdadeiras damas têm pés finos, macios, agradáveis, pele suave e hidratada em todos os pedaços.

Ora, os seus calinhos destoavam dos standart atual de delicadeza feminina. Era preciso enquadrar-se, curvar-se aos moldes adocicados de beleza, assim como seus não tão finos pés.

Marcou consulta. Um especialista. Analisou calo a calo, linha a linha, impressionado. Parecia mesmo assustado. Meus pés, me olhavam ainda mais assustados. Era um de dia difícil para eles.

Acalmei-os. O especialista ajudou: massagens e cremes perfumados, refrescantes... até a lixa foi gentil com eles.

Sai feliz e satisfeita. Tinha pés como os das mais belas, pés de artistas de cinema! Uau!

Uau! Uau, au, auuu, ai, ai, aiiii, poxa vida!

Como dói.

Foi isso. Meus sapatos me detestam. Todos, todinhos, só restaram umas velhas havainas, porque elas não odeiam ninguém, coitadas.

Era como se tivesse desaprendido a andar, de tão desajeitada que fiquei. Ai! Outro pedacinho que se contorcia, as voltas com as tiras de minhas sandálias vermelhas: lindas e cruéis.

Meus pés retrucaram. A cruel era eu. Lapidadora injusta de calinhos de proteção!

Quem mandou tentar andar com pés dos outros?

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